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VAGUELIS SILVA

En lutar-se - Série Vida na Morte, 2023

Site-specific e publicação digital

Fotos: Vaguelis Silva

“Dentre os ritos que cercam a morte, o cobrir-se de luto é um processo inescapável. Na cultura ocidental capitalista este tema é evitado, porque a morte é algo de que se quer afastar, contra a qual se pretende lutar. Em especial, do século XX aos dias atuais, lidar com a morte implica em se passar a impressão de que "nada mudou" no cotidiano. Expulsa-se a morte para se proteger a vida; em outras palavras, a morte deve passar despercebida. Na Antiguidade, havia um temor quanto a morte repentina, não percebida. Atualmente, a morte é um processo cada vez mais domesticado pela ciência que o desnaturaliza, na tentativa de higienizar o corpo e as relações socioafetivas no entorno daquele que está morrendo. As consequências disto podem ser percebidas na falta de apreensão sobre a morte, em si, na pressão social para que seja rapidamente superada e no posterior e impositivo silenciamento da dor e do luto. Aproximando-me das reflexões sobre a morte e dos variados sentimentos que atravessam aqueles que já sofreram uma perda, produzi o trabalho artístico chamado "En lutar-se", por meio do qual tento transbordar algo que é íntimo, subjetivo e existencial, para a esfera pública. O trabalho, do ponto de vista conceitual e material, foi construído a partir do meu próprio processo de luto e autoconhecimento acarretados pela perda de minha mãe, devido ao câncer, no ano de 2020. A minha perda pessoal está inter-relacionada com o acontecimento da pandemia de COVID-19, que resultou em milhares de mortes e em famílias enlutadas. A eleição de um objeto figurativo, simbólico, como o é um casulo, associa os cinco estágios do luto – negação, raiva, barganha, depressão e aceitação – com o processo de metamorfose de uma borboleta. Portanto, neste trabalho, o casulo é um elemento metafórico que envolve o processo solitário de uma transformação individual, em seus diferentes estágios, por vezes dolorosos e demorados, mas que, ao final, pode levar ao entendimento de que a vida é composta de impermanências. No sentido de enfocar a ideia de impermanência, elaborei os casulos com argila, que não foram queimados, não se transformaram em cerâmica. Expostos às intempéries e a processos naturais de degradação, os casulos configuram-se como objetos efêmeros, impermanentes, que retornam à terra. Trata-se de um trabalho em processo que, no futuro, poderá se desdobrar em diferentes linguagens. Luto. En lutar-se. Lutar o inelutável”.

 

“En lutar-se - Série: Vida na morte

O cadáver contém o segredo da vida e da morte. Ele faz parte da natureza e, como tal, sua composição pode ter a potencialidade de fertilizar a terra, o que o torna um elemento integrante do ciclo da vida, por exemplo, impulsionando o crescimento de flores. A ambientação de casulos aderidos aos galhos de uma árvore, no jardim do Departamento de Artes da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pode causar estranhamento e iludir o observador sobre se o que está vendo ocorreu de maneira natural ou não. A proposta é causar a reflexão sobre os ciclos naturais, a efemeridade, a decomposição do que é vivo e a sua integração em novas materialidades e corpos. O tempo é parte intrínseca do trabalho, como uma de suas dimensões mais importantes.

A argila reciclada e utilizada na produção dos casulos passou por diferentes processos de modelagem e por experimentações. Conceitualmente, a ênfase recai sobre a dissolução da matéria orgânica, por decorrência do tempo, e em outras interferências externas que podem provocar eventuais modificações nos casulos. Do ponto de vista formal, os casulos não seguem um padrão específico de manufatura, pois cada um tem uma modelagem única. Alguns são fechados; outros, abertos, ou ainda encontram-se abrindo. Esta diversidade de estados aponta para a cognição sobre o passar do tempo e de que maneira ele afeta cada ser vivente".

*LUCTUS dá nome ao objeto “Casulo-Mãe”, do qual são gerados os casulos menores.

- Vaguelis Silva -

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